Relatório diz que banco investiu R$ 2,1 bi em empresas sem capacidade econômica e aponta que cenário ‘pode comprometer severamente a solidez patrimonial da instituição’; Master afirma que investimentos foram integralmente quitados (Por Aguirre Talento) - foto divulgação -Uma investigação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apontou pela primeira vez a suspeita de crimes financeiros na gestão do Banco Master, por meio de investimentos milionários fraudulentos que inflaram o patrimônio da instituição e permitiram o aporte de recursos até mesmo em empresas vinculadas à irmã do dono do banco, Daniel Vorcaro.
De acordo com a CVM, o Master investiu um total de R$ 2,1 bilhões em empresas sem capacidade econômica suficiente para dar retorno a esses investimentos. Essa situação, aponta o relatório, “pode comprometer severamente a solidez patrimonial da instituição financeira”. O Estadão teve acesso, com exclusividade, a detalhes da apuração sigilosa da CVM.
Procurado, o Master afirmou que esses investimentos “já foram integralmente quitados, não havendo qualquer exposição” (leia mais abaixo).
Segundo a investigação, essas operações podem ter inflado artificialmente o patrimônio do banco para torná-lo mais atrativo em uma negociação no mercado.
Atualmente, o Banco Central analisa uma proposta feita pelo BRB, banco estatal de Brasília, para a compra de 58% do Master, operação que vem sendo questionada pelo Ministério Público do Distrito Federal. Como mostrou o Estadão, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não vê com bons olhos o negócio e dentro do BC há uma divisão sobre o caso.
A principal suspeita apontada pela CVM envolve um investimento de R$ 361 milhões em uma pequena clínica médica localizada em Contagem (MG), na região metropolitana de Belo Horizonte.
A empresa registrou receita operacional de apenas R$ 54 mil ao ano antes de receber os aportes milionários e pertence a uma laranja, de acordo com a inspeção da CVM. Ou seja, para o órgão regulador, a clínica médica está registrada em nome de uma proprietária, que não é a verdadeira dona do negócio e nem a responsável por esses investimentos milionários.
Recepcionista é dona de clínicaA apuração teve início para fiscalizar a atuação da Laqus Depositária de Valores Mobiliários, por meio da qual foram comercializados os títulos de dívidas de empresas no mercado de capitais com o objetivo de captação de recursos.
Os inspetores analisaram a emissão de notas comerciais no valor total de R$ 361 milhões em nome da Clínica Mais Médicos S.A., sediada em Contagem (MG). Os dados financeiros da empresa, entretanto, chamaram a atenção do trabalho de auditoria. A receita operacional bruta da clínica em todo 2023 foi de apenas R$ 54 mil.
“Observa-se, portanto, que o valor total recebido pela empresa a título de pagamento pelas NCs emitidas supera em mais de 6.500 vezes a receita operacional bruta apurada no exercício de 2023”, diz o parecer técnico.
A CVM apontou que a fachada da clínica tem uma estrutura “demasiadamente rudimentar” e não reflete os aportes milionários recebidos. Além disso, o relatório registrou que a sócia da clínica havia trabalhado como recepcionista em outra empresa e vive em um imóvel “notadamente modesto” e incompatível com o aporte milionário recebido pela empresa.
Procurada, a Clínica Mais Médicos S.A. disse em nota que “todas as operações financeiras realizadas com a referida instituição (Master) foram integralmente quitadas, inexistindo qualquer pendência financeira" (leia mais abaixo).
Após analisar os aportes financeiros, a CVM então descobriu que as notas comerciais de R$ 361 milhões emitidas para captar investimentos na clínica tiveram um único investidor: o Banco Master.
A partir dessa constatação, a auditoria identificou outros aportes suspeitos e possíveis vínculos das empresas com a irmã do dono do banco.
De acordo com o relatório, o Master aportou R$ 2,1 bilhões em notas comerciais de dez empresas emitidas pela Laqus no período de 2022 a 2025. Para a CVM, há indícios de que as companhias não tinham capacidade econômico-financeira para respaldar o volume das emissões.
Por causa desses elementos, o parecer técnico aponta indícios de irregularidades nessas operações e diz que inflaram o patrimônio do banco, colocando em risco sua solidez financeira.
“Considerando que o patrimônio líquido do Banco Master S.A. em 31/12/2023 foi de R$ 2.382.446,00 e em 31/12/2024 foi de R$ 4.740.713,00, é razoável afirmar que somente o valor total investido pelo Banco Master, por meio do fundo CITY 02, concentrado nesses poucos emissores, pode comprometer severamente a solidez patrimonial da instituição financeira no caso de inadimplemento dos ativos investidos”, diz o relatório.
Procurada, a Laqus afirmou que cumpriu os requisitos legais nessas transações e disse que não é a responsável direta pela emissão das notas comerciais, apenas a depositária delas. “Temos por obrigação regulatória validar se as transações cursadas em nosso ambiente de depósito atendem aos requisitos legais e infralegais de uma transação legítima de mercado de capitais, que foi o que realizamos para as transações citadas”, disse.
O relatório da CVM conclui que há indícios do envolvimento de diversos agentes do mercado financeiro em um esquema de práticas irregulares e operações fraudulentas nesses aportes do Master. Diz ainda que os fatos “podem indicar a ocorrência de crime”.
Ao final, a Procuradoria Federal Especializada junto à CVM também apontou a existência de indícios de crime. “No estado em que o processo se encontra, e, diante dos elementos de prova e informações existentes, constata-se que, de fato, existem suficientes indícios de conduta tipificada como crime, na forma do art. 4º da Lei 7.492/86”, diz o parecer. O artigo citado define o crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, que prevê pena de reclusão de três a doze anos.
A investigação da CVM foi enviada aos órgãos de controle e ao Banco Central, para subsidiar as investigações e discussões sobre a negociação para compra do Banco Master.
Veja a íntegra da nota do Banco Master“O Banco Master esclarece que não possui relação com a LAQUS Depositária de Valores Mobiliários S.A. e não mantém atualmente operações de crédito com as empresas mencionadas na reportagem.
Os créditos citados, por meio do fundo mencionado, já foram integralmente quitados, não havendo qualquer exposição.
O Banco manifesta surpresa com as alegações, pois nunca foi formalmente solicitado pela CVM a prestar esclarecimentos, e considera inadmissível a abertura de procedimentos com vazamento seletivo de informações à imprensa. O Banco Master adotará todas as medidas cabíveis nas esferas administrativa, civil e criminal para proteger sua imagem e assegurar o devido processo legal."
Veja a íntegra da nota da Clínica Mais Médicos S.A.“Informamos que a Mais Médicos S.A., integrante de um grupo com mais de 30 anos de atuação no setor de saúde suplementar, possui presença consolidada em diversas regiões do País, por meio de parcerias com hospitais, operadoras e empresas privadas, contribuindo diretamente para a promoção da saúde de milhares de pessoas.
Recentemente, o grupo concluiu a aquisição de uma empresa de porte relevante no segmento, fortalecendo sua atuação estratégica e impulsionando a expansão de suas operações de forma sustentável e transparente.
No que se refere ao Banco Master, esclarecemos que todas as operações financeiras realizadas com a referida instituição foram integralmente quitadas, inexistindo qualquer pendência financeira.
A empresa e o grupo receberam com surpresa os questionamentos apresentados e, por meio de sua assessoria de imprensa, reafirmam o compromisso com a ética, a conformidade regulatória e a transparência que sempre pautaram suas relações institucionais e comerciais." (Fonte: Estadão)
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