A digitalização provoca o fechamento de milhares de agência bancárias, causa demissões e desafia a organização sindical (Por Davi Molinari)Em uma década, o número de agências bancárias no Brasil despencou do pico de 23.154 unidades, registrado em março de 2015, para cerca de 15.529 em julho de 2025. O dado, divulgado pelo próprio Banco Central (BC), é um sintoma da transformação que a digitalização trouxe ao sistema financeiro nacional.
Boa parte das operações migrou para o ambiente digital. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em levantamento feito junto com a Deloitte, 82% das transações bancárias em 2025 já são realizadas via aplicativos ou internet banking. “O fechamento das agências e o avanço acelerado da digitalização têm fragilizado a organização dos bancários de várias formas. Quando o trabalho é fragmentado, remoto e individualizado, isso enfraquece o sentimento de pertencimento e, consequentemente, a capacidade de mobilização”, relata Andréia Sabino, presidenta da Federação dos Bancários da Bahia e Sergipe (FEEBBASE). “Antes, o sindicato encontrava o bancário na agência — hoje precisa encontrá-lo nas redes ou plataformas digitais”, completa.
Uma categoria em transformaçãoUma pesquisa do Dieese mostra que, atualmente, existem cerca de 400 mil bancários com carteira assinada, ante aproximadamente 450 mil em 2015. Só em 2024, bancos brasileiros fecharam mais de 6.000 postos de trabalho. “Os bancos usam tecnologia, também, para cortar custos e demitir. O caso do Itaú, com mil dispensas em um dia, revela uma escolha política de priorizar lucros em detrimento de empregos e atendimento à população.”, afirma Andréia.
Apesar das demissões, um estudo elaborado pelo Comando Nacional dos Bancários em parceria com o Dieese comprova que o setor financeiro tem aumentado a base de trabalhadores, via o crescimento das fintechs, que operam com regras mais flexíveis que os bancos e não cumprem a Convenção Coletiva dos Bancários, mesmo realizando atividades semelhantes. “Embora o setor financeiro tenha ampliado o número de ocupados, o total de bancários diminuiu”, aponta Augusto Vasconcelos, secretário estadual de Trabalho da Bahia e presidente licenciado do sindicato dos bancários da Bahia.
O desafio da organizar a categoria na era digitalEssa mudança impacta também o poder de mobilização dos trabalhadores. Na década de 1980, greves da categoria paralisaram o país. Em setembro de 1985, cerca de meio milhão de bancários aderiram à greve nacional liderada por Luiz Gushiken, então presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo. “Naquela época, uma paralisação era capaz de parar cidades inteiras”, recorda Elder Fontes Perez, presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia (SBBA). “Hoje, se fechamos uma agência, a produção continua via aplicativo ou computador. Uma greve não causa mais a interrupção total das atividades”, pontua.
Diante desse contexto, Elder destaca outro dado da nova geografia bancária: “Existem municípios na Bahia onde funciona apenas uma agência bancária, e muitas delas estão sendo fechadas. Isso é uma demonstração da falta de responsabilidade dos bancos, tendo em vista populações vulneráveis de idosos, pessoas com dificuldade de locomoção e analfabetos digitais”. Segundo levantamento do Banco Central, apenas 55% dos municípios brasileiros possuem ao menos uma agência, deixando mais de 2.400 cidades sem atendimento presencial — situação que afeta cerca de 18 milhões de pessoas. O problema é reconhecido por sindicatos e também pela Febraban, que admite: “A digitalização facilita para muitos, mas escancara a exclusão de grupos vulneráveis”.
A Federação dos Bancários e o Sindicato dos Bancários da Bahia encaminharam denúncias ao Procon sobre a violação dos direitos previstos no Código de Defesa do Consumidor, pautando a responsabilidade dos bancos sobre o acesso aos serviços essenciais. “O sindicato tem denunciado que funções novas — sobretudo em tecnologia da informação, mas também no setor negocial — estão sendo preenchidas por terceirização e até pejotização”, alerta Augusto Vasconcelos, secretário estadual de Trabalho da Bahia e ex-presidente do sindicato dos bancários. Segundo estudo elaborado pelo Comando Nacional dos Bancários em parceria com o Dieese, enquanto o setor financeiro aumentou o número de ocupados, o total de bancários encolheu — fintechs e intermediários digitais contratam cada vez mais fora das regras da convenção coletiva da categoria.
O movimento sindical bancário se vê diante de uma acelerada transformação no setor que não apenas desmobiliza a categoria diante das demissões, mas também por causa do fim da convivência presencial dos trabalhadores, cada vez mais em regime de home office. “O desafio é transformar a distância em conexão”, sintetiza Andréia.
O avanço tecnológico no setor financeiro não pode servir de justificativa para a precarização das relações de trabalho nem para a exclusão de milhões de brasileiros do acesso a serviços essenciais. “A Constituição Federal assegura a proteção do emprego frente à automação e impõe às instituições financeiras — especialmente às mais lucrativas — o dever de garantir inclusão, reinserção profissional e atendimento digno à população”, conclui, Vasconcelos. (Fonte: Vermelho)
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